sábado, 25 de setembro de 2010

Falando demais

Esta é uma fala muda,
Dessas que ninguém escuta.
É um jogo de palavras...
Que nada diz,
Mas muito fala,
Pois a fala fica muda
Quando se muda a fala
E emudece o interlocutor
Que com palavras brincou.

Não se pode mudar a fala
Depois que já se falou.
Então fica o dito pelo não dito,
Muda depressa o assunto,
E faz de conta que ninguém escutou.

Lilia Maria

Isso é quase um pedido de desculpas para alguém que de vez em quando eu emudeço com a minha fala. A intenção não é ruim. É como um jogo, e a saída, ou seja, a mudança de assunto tem que ser sutil.
De qualquer forma, prometo melhorar... Não quero perder o amigo! Nunca!

terça-feira, 21 de setembro de 2010

No final dá tudo certo

Eu não vou lá,
E você não vem aqui.
Brincamos de esconde-esconde
Na noite de lua nova.
Eu escondo meu sorriso
E você, o seu olhar.
Eu escondo a paixão
E você, a vontade de sonhar.
Estou nua dos meus pudores,
Deixei todos do lado de fora...
Eu escondo os meus medos
E você, a inquietação.
Eu me escondo de você
E você?
Adianta se esconder?


Lilia Maria

Ando em pleno pique de adolescente. Eu, uma cinquentona aposentada, que deveria estar pensando em cuidar de netos, de repente me vejo assim. Saio para ir a um jantar de família, toda vestida de senhorinha. Danço a noite toda como nunca fiz antes na vida e volto para casa despenteada, suada, com a meia rasgada, mas feliz, feito uma moleca levada. Acho que eu andava me escondendo de mim...

domingo, 19 de setembro de 2010

Iluminecência

O que procuro aqui
Com esta luz de lamparina
Que mal ilumina
Aquilo que se pode ver?
O que posso encontrar
Tateando com as mão trêmulas,
Inibidas pelo medo
De perceber e ser percebida,
Nesta nova investida,
Timida e recolhida,
Mas muito ousada
Para aquilo que é permitido
Aos que não foram escolhidos?
Que pergunta boba!
Qualquer cristão de boa índole
É capaz de responder
Que o que os olhos não enxergam
É melhor deixar passar,
Pois quem vive na inocência
Tem candura no olhar.

Lilia Maria

sábado, 18 de setembro de 2010

Garimpando palavras

Estou aqui hoje às voltas para escrever uma mensagem para um senhor que considero muito e que vai aniversariar na semana que vem. Não sei por onde começar.
No ano passado, último ano em que ele ainda podia ser chamado de cinqüentão, veio fácil o tema que me deu inspiração: um abraço. E por que o abraço? Lembrei do dia que marcamos de tomar café e ele chegou meio atrasado. Eu estava ali, sentada no banco da pracinha, quando entra um carro depressa na curva, e para meio torto no meio fio... Não vou dizer o que pensei, pois depõe contra nós dois. Ele saiu do carro, com cara de quem perdeu a hora de acordar, meio sem graça e já pedindo desculpas. Simplesmente abri os braços, e disse com toda sinceridade: - Santa criatura, que bom te ver outra vez.
O poema saiu limpo, sem retoque, como tudo que escrevo com a alma e o coração. Depois acabei pensando outros versos, outras formas de expressar o quanto gosto de abraçar e ser abraçada. Para mim o abraço é vital.
Hoje a palavra não engrena... Só consigo imaginar que a grande maioria dos meus amigos já está chegando lá... Despendem-se idade mágica de quem algo mais que meio século viveu e vão se envolvendo pouco a pouco, quase sem sentir, no orgulho de ser um sexagenário, com tudo em cima, lindos, maduros, prontos para continuar a jornada como quem acaba de começar.
Como já disse algumas vezes, não importa a idade, os cabelos brancos pintados (ou arrancados) pacientemente pelas vestais do tempo, as marcas deixadas como pegadas que denunciam a data da certidão de nascimento ou outras coisas que muitos ostentam orgulhosos, mas que outros tentam de todas as maneiras esconder. O que vale de fato nesta vida é a história que escrevemos e deixamos escrever naquele livro que nos foi legado na hora em que fomos gerados. São as páginas que ousamos povoar, nossas ou de quem vamos encontrando na estrada, que se entrelaçam e vão formando uma infinita enciclopédia do viver e do saber.
Não sei como começar, mas vou certamente saber terminar, dizendo que sinto falta dos encontros casuais que há muito não acontecem e enviando mais um abraço para a santa criatura que insisto em não colocar de novo na caixa dos guardados do passado.
Lilia Maria

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Amor e Paixão

Paixão é verso,
Amor é poesia.
Paixão é vendaval,
Amor é calmaria.

Esta foi uma das respostas que postei hoje no Facebook à pergunta proposta pela Marcia Pitta: - Alguém sabe me dizer a diferença de amor e paixão? Como responder? Achei que este post ia bombar. Quando se trata de falar destes sentimentos todo mundo vira doutor... Quem nunca curtiu uma paixão? Quem nunca viveu um grande amor?

Apesar de ser uma eterna apaixonada e de amar o amor, creio que ainda tenho muito que aprender. Nem sei se algum dia estarei pronta para falar algo definitivo sobre estes dois sentimentos que podem caminhar juntos, se completarem ou estar numa mesma linha se alternando conforme a situação.

Quando se fala de amor e paixão, automáticamente a imagem que nos vem é de um casal que compartilha de forma sublime estes dois sentimentos. São os esteriótipos herdados da educação que recebemos. A minha geração sofreu quase que lavagem cerebral para interiorizar que amor é sagrado e que sexo é pecado. E a paixão acabava sendo quase que um sinônimo de luxúria, um dos sete pecados capitais. Mas não é só disso que quero falar.

Aqui cabe uma reflexão. Quantas vezes ouvi alguém dizer: - Amo arroz com feijão! Tudo bem... Mas... - E o arroz com feijão? Ele ama você? Aí vem a cara de interrogação... Dizer isso é muito diferente de dizer – Marcia, eu amo você! A Marcia pode até me amar (ou não!). Mas há a possibilidade. Mas isso não significa que quero ter com a Marcia uma relação diferente da de amizade. Claro que vou ficar feliz quando encontrá-la, vou abraçá-la, os três beijinhos tradicionais, perguntar da vida, da família, dos amores... (e olha ele aqui de novo!) Eu posso amar a Marcia, mas não vou ter nenhuma idéia romântica... afinal do que ela gosta eu gosto também... Quer dizer... Mais ou menos... Se bobear ela monta um asilo e eu... Bem, eu estou mais para creche... – maldade do Herera e da Glorinha...

Mas voltando ao tema central e deixando de lado as confidências (ou maledicências para ser mais clara), creio que o amor pode até ser descrito matemáticamente (olha só a minha paixão!) como uma função não linear. Um dia se ama mais, no outro se ama menos, numa época o amor é muito e de repente ele pode virar muito pouco. Ele pode tender a zero no limite da situação, mas não sei se ele chega a zero não, pois se a zero chegar, deixa de ser amor e vira um outro sentimento que não é amor não.

Será que um dia a gente deixa de amar? Eu acho que não. Por experiência própria digo, sem medo de errar: nem a morte mata o amor. E a paixão? A quantas anda a paixão? Paixão é uma coisa louca, arrebata, explode, te deixa de quatro... A gente ri, canta, dança... Parece que o coração não cabe no peito... Paixão é prender a respiração e morrer de tesão...

Amor e paixão podem ou não caminhar juntos, mas se estiverem na mesma hora e no mesmo lugar, nada pode ser mais incrível, mais gratificante.

Marcinha, não sei se repondi a sua questão, mas me deu um prazer incrível filosofar em cima de um tema tão gostoso.


Lilia Maria

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Entristecente

Vou trancar portas e janelas
Até cessar o vendável,
que me sacode dos pés à cabeça
e me arrasta pelo quintal.

Vou morrer mais uma vez
E renascer na água fria
Que gela o coração
E cola meus pés ao chão.

E depois na calmaria
Vou continuar a sorrir
Com o sangue que corria nas veias
Se esvaindo pelos poros
E marcando cada passo do caminho
Com rubros rastros deste crime
Que acabo de cometer.

Matei o amor em seu leito branco,
Rebento do ventre aberto em flor.
Não tenho mais nada,
Só pesar e amargor.