quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Um trote legal...

Toda vez que vejo notícias de trotes violentos, lembro-me, e não sem motivos, com saudades do meu trote quando entrei na EESC. Podem os mais jovens me chamar de “quadrada” (hoje já não é esta a expressão que usariam), retrógrada, boba e sei lá mais o que, mas para fazer um trote legal precisa de muita inspiração e vontade de arregaçar as mangas.
Lembro-me bem do dia em que, toda tímida, meio sem graça, cheguei ao Centro Acadêmico Armando de Salles Oliveira (CAASO) e fui recebida por uma comissão que tinha como tarefa me “batizar”. Este batismo nada mais era do que me arrumar um apelido que era escrito num “medalhão” de plástico amarelo com o símbolo da Minerva desenhado em azul-marinho. Sei lá porque me acharam com cara de Ricota, claro que o apelido não pegou, embora até hoje haja quem ainda se lembre dele.
O tal medalhão não poderia sair do meu pescoço por nada até o dia do Baile do Bicho, mais ou menos um mês depois, quando seria decretada a nossa alforria.
Durante aquele mês, quase todos os dias havia uma atividade sócio-artistica-esportiva-cultural que devíamos participar. Cada atividade valia certo número de pontos. Para conquistar a alforria devíamos somar, se não me engano, 1000 pontos. Caso o CCC, Comissão Caça Calouros – uma nítida crítica à Comissão Caça Comunistas da época – encontrasse algum calouro sem o tal medalhão este era penalizado perdendo pontos. Aí, para recuperar os tais pontos tínhamos que fazer tarefas adicionais, como por exemplo, varrer salas do CAASO, arrumar materiais e sei lá mais o que. Eu estava sempre pagando castigo, pois um dos amigos do meu primo aparecia logo pela manhã quando eu estava saindo da cama sem o tal medalhão e lá se iam os meus preciosos pontos...
O ponto alto do trote era organizar um show para divertir os veteranos. Este eu vou contar num post especial... Valeu muito e acho que quem participou nunca mais esqueceu.
O trote do CAASO na época só deixava triste aquele que queria exibir uma lustrosa careca, marca registrada de quem havia vencido o vestibular. Pois é... Nem o cabelo dos rapazes era cortado. Para aqueles que tivessem vontade de fazê-lo era só entrar na sala do barbeiro do Centro Acadêmico e mandar passar a máquina. Muitos continuavam a exibir a preciosa (às vezes nem tanto... rs) cabeleira cultivada nos tempos de cursinho. Foi o caso do Sacristão (apelido do José de Anchieta Rodrigues) do Mikka (apelido do Edmir Jesus Nania, que certamente lerá este post), do Zé Edu (José Eduardo Martinhos Hornos), do Fred (Giles Felipe Lucien Garnero – o francês) e tantos outros que já não me lembro mais.
Passei por outro trote engraçado e nada violento quando entrei na Faculdade de Educação Física da USP. Lembro-me que um dia nós tínhamos que fazer um “caça ao tesouro” pelo campus, vestidos de pijama, e andando de circular (ônibus gratuito que circula apenas dentro da Universidade).
Em cada ponto de parada recebíamos um “adereço”. Laços, tinta própria para pintar a pele, colares, bexigas amarradas nos pulsos... Enfim, nada que pudesse causar danos ou ferimentos, apenas certos “constrangimentos” que na verdade eram mais do que esperados, aprovados e curtidos.
Acho que o pessoal precisa começar a pensar mais no que pode significar “receber os calouros”. Ninguém merece sair machucado do que deveria ser uma festa de integração.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Divagando sobre a Matemática

A Matemática, considerada por muitos pensadores como a mãe e todas as ciências por sua lógica e conceitos, já foi definida por Galileu Galilei como o alfabeto com o qual Deus descreveu o universo. Ao longo o tempo, se desenvolveu em teoremas, axiomas, postulados e algoritmos que, dos mais simples problemas às mais sofisticadas teorias, busca explicar e resolver.
Teria a Matemática, tão eterna, tão exata em sua essência, imitado a vida, tão volátil, mutável e surpreendente? Por certo que sim. O que não é a vida senão uma grande teoria construída sobre uma tabela de valores definida pelo meio social? E o que são estes valores senão axiomas e postulados que se explicam por si só, sem a necessidade de demonstração?
Ah! Diriam agora os leigos mais incautos, então todo mundo pensa e vive da mesma forma, pois a base é sempre a mesma! Não, eu responderia. A Matemática, assim como a vida, é feita de modelos. Cada modelo tem suas “verdades” e cada “verdade” só é “verdade” dentro de um certo modelo. O que é imutável é a lógica que encadeia estas “verdades” para desenvolver as suas teorias. Maluquice? Nem tanto... Basta lembrar que as retas paralelas passam a se encontrar no infinito quando falamos das geometrias não euclidianas.
Lilia Maria

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Histórias do meu pai (I)

Meu pai, batizado Breno Faccio, com os seus 85 anos completados em dezembro passado, está se tornando cada vez mais um grande contador de histórias. Volta e meia eu gravo algumas conversas, pois um dia ainda quero transformar tudo em um livro.
O único problema está em ter certeza que o personagem principal é mesmo aquele que ele coloca, pois já peguei a mesma história com atores diferentes. Mesmo que alguma coisa seja da sua imaginação, a maior parte do que ele conta é a mais pura verdade.
De qualquer forma, vou tentar tomar cuidado com o que vou escrever, pois muitos dos personagens, apesar de já terem morrido, são personalidades principalmente do mundo político.
O Sr. Breno nasceu em Ribeirão Preto em 1924. Menino pobre, desde cedo começou a trabalhar para ajudar no sustento da casa. Diz ele que já aos 8 anos trabalhava em uma oficina mecânica sendo que aos 12 já era chefe e ganhava tanto ou mais que seu pai.
Quando tinha 16 anos arrastou a família toda para São Paulo onde montou uma oficina mecânica na região central da cidade. Como era época da guerra e havia racionamento de combustível, especializou-se em adaptar carros de passeio para o uso de gasogênio.
Não vou me aventurar aqui a explicar o que é o tal gasogênio, pois nem tenho conhecimento suficiente para isso. Só sei pelo que meu pai conta que era um aparelho transformava, por combustão, carvão vegetal em gás. Era este gás que fazia o motor funcionar. Era um processo simples e barato, porém trabalhoso e altamente poluente além de outros inconvenientes.
Um dos clientes do meu pai, que veio a ser seu amigo e companheiro de pescaria, foi o Dr. Ademar de Barros. É muito engraçado vê-lo imitando a voz do Dr. Ademar. Lembro-me bem da figura. Meu pai costumava freqüentar a sua casa e conhecia bem toda a família. Ainda hoje, quando ando com ele lá pelos lados do bairro de Higienópolis, ele se lembra perfeitamente onde eram as casas da família apesar de já terem sido demolidas e transformadas em grandes edifícios.
Outro dia ele contou que “causo” interessante que foi contado pelo Dr. Ademar. Diz ele que um figurão, acho que era um antigo Presidente da República, estava um dia pescando quando foi abatido por uma sede muito grande e estava sem água potável. E repente ele avistou uma melancia enorme. Olhou para os lados e não viu ninguém. Sacou o canivete (pescador sempre tem um) e saciou a sede comendo a tal melancia. Quando terminou não achou justo se servir sem pagar. Sacou então a carteira do bolso, pegou dinheiro que achou suficiente para cobrir o prejuízo e colocou no lugar da fruta com um bilhetinho dizendo que se o dinheiro não fosse suficiente que o dono poderia cobrar a diferença dele. Assinou e colocou o endereço. Apesar da atitude até que foi um gesto honesto. Qualquer dia destes vou perguntar a ele quem era este cidadão.
Apesar de ser um pai bravo e castrador, de vez em quando, em nossas conversas, ele fica dando conselhos. Alguns viraram um poema. Não é lá essas coisas, mas sempre me fará lembrar dele.

Conselhos do meu pai
Se o vaso quebrou,
Não adianta consertar,
A água certamente vai vazar,
Você pode não perceber,
E as flores vão murchar.

Se você ainda gosta dele,
Nem tente os cacos colar,
Jogue tudo fora,
Compre outro igual,
E comece tudo outra vez.

Novo vaso,
Novas flores,
Tudo novo,
Vida nova.
Acredite de novo,
Confie e deixa a poeira baixar.

De repente você pode perceber,
Que era isso que faltava:
Renovar,
Esquecer velhos hábitos,
Criar um novo arranjo,
Para a vida continuar.

Não se apegue em velhas promessas,
Novos rumos são bem vindos.
Você pode até com as mesmas pessoas
À mesa se sentar,
Mas troque posições,
Mude a conversa,
Faça outro cardápio para o jantar.

Quem sabe ao final
Fique tudo no lugar.
O que passou passou,
Não adianta lamentar,
Faça de uma experiência infeliz
Motivo para crescer
E nunca para parar.

Lilia Maria
10/09/2003