terça-feira, 2 de novembro de 2010

A Panelinha

Estava lendo o blog de um amigo da época do colégio que acabou enveredando pelo mundo da política e de repente me deparei com uma fala muito conhecida. Ele conta que em ano político é sempre a mesma coisa. Candidatos saem à rua procurando o eleitor e lembrando a eles que a rua deles foi asfaltada; que a mãe foi atendida no hospital; que foi colocado luz em tal rua e por aí vai.
Certamente estes candidatos em outros tempos mal falam bom dia para um eleitor, aliás, nem mesmo se preocupam em caminhar pelas ruas e verificarem como andam as coisas ou do que os eleitores estão precisando. A maioria pode ser chamada de burocrata de gabinete e olha lá...
Essa leitura acabou me levando a uma história que aconteceu quando eu cursava o último ano da graduação da Matemática na USP. Não vou citar nomes, mas se algum colega da época ler, certamente lembrar-se-á do que falo.
Todo anos era a mesma coisa... Chegava a época das eleições para o Centro Acadêmico lá pelo mês de outubro e o IME entrava em greve. Eu nunca ouvia falar que a greve era para que os melhores professores da casa dessem aula para nós (os melhores estavam sempre na Poli) ou que melhorassem as condições das salas da Reitoria Velha que era onde tínhamos aulas. A greve era sempre deflagrada pelo fim da opção interna.
Para quem não sabe, quem prestava vestibular para Matemática tinha um ano de aulas com matérias básicas – cálculo, física, álgebra, etc. Ao fim do segundo semestre, o aluno optava pela carreira a seguir. Eram 5: pura, licenciatura, estatística, computação e aplicada. Ele estabelecia uma ordem de prioridade e seguindo o ranque de notas as vagas eram distribuídas. Era mais do que prestar um novo vestibular.
E isso não era só na matemática. Todos os cursos da USP que tinham um ciclo básico para depois distribuir os alunos pelas carreiras funcionavam assim. E funcionou assim até a bem pouco tempo. Lembro-me bem de quando a minha filha mais velha cursava engenharia na Poli. Aliás, na Poli era até pior que na Matemática, pois ao fim do primeiro ano optava-se pela grande área: civil, elétrica, mecânica, química e sei lá que mais. Depois, no final do segundo ano vinha a opção pela carreira. E tinha que estudar MUITO para chegar com tranquilidade aonde se queria chegar.
Certa vez, conversando com o Dr. Waldyr Oliva, na época diretor do instituto e posteriormente reitor da Universidade, ele alertou que não seria viável abrir tantas vagas nos cursos quanto os alunos interessados por uma questão econômica. Era preciso lançar no mercado, profissionais de todas as áreas e de forma equitativa. Claro que fazer esta opção na hora do vestibular era mais justo, mas aí implicava em outras coisas que não vem ao caso agora.
Voltando ao IME...
Durante o ano todo quase ninguém sabia nem muito ao certo quem eram as pessoas do Centro Acadêmico. Tirando a sala onde a gente jogava ping-pong nos intervalos de aulas, nem mesmo saberíamos que existia o tal centro acadêmico. Aí, na época de eleição todo mundo aparecia... Na aula, na sala de jogos, nos corredores... E era tapinha nas costas de um, beijinhos na bochecha de outra... Eles surgiam do nada... E se ocupavam principalmente dos ingressantes... Eram eles que tinham que fazer a opção interna... E os “amiguinhos” iam fazer greve para acabar com ela. E era sempre a mesma turma. Ninguém entrava, ninguém saia... e ninguém se formava...
Invariavelmente esta greve não dava em nada e os “gracinhas” eram eleitos. Não sei o que eles ganhavam com isso... Em São Carlos, o presidente do CAASO tinha, além do prestígio, uma estrutura para gerir. Era a gráfica, o cursinho, uma parte político-social-esportiva ativa, atuante, influente... A experiência adquirida era o melhor aprendizado conseguido na academia. E isso dito por quem passou por lá... Eu mesma estive envolvida por mais de dois anos na estrutura, dirigindo os esportes femininos. Esta experiência foi de grande valia quando assumi o comando da microinformática da Secretaria Municipal de Educação. Mas e o CEFISMA? Não me recordo de nada que tenha acontecido nos três anos e meio de IME.
Quando estávamos no último ano resolvemos questionar os métodos eleitoreiros. Acho que acabamos com o sono tranqüilo dos candidatos por alguns dias. Criamos a ante chapa: A Panelinha.
Éramos anônimos. Fazíamos cartazes e espalhávamos em lugares estratégicos questionando a postura dos colegas. Colocamos o dedo em muitas feridas. Fizemos muita gente pensar.
Certamente se tivéssemos nos lançado oficialmente teríamos ganho a eleição de lavada, mas éramos formandos e a maioria não podia se dar ao luxo de ficar mais um ano na Universidade.
Foi um grande exercício. Até hoje quando encontro colegas da época, muitos me perguntam se eu fazia parte da Panelinha e quem eram os outros integrantes do grupo, mas sempre tivemos o compromisso que não divulgar nenhum nome a não ser o próprio se assim quisesse. Eu já assumi publicamente o meu papel nesta história mais de uma vez.
Digo sempre que se algum colega da época aprendeu como reconhecer e fugir dos “fisiológicos”, valeu a penas as horas de sono perdidas para produzir o material da nossa campanha.

2 comentários:

  1. Um comparativo que se faz presente em várias etapas da vida de cada um de nós quer seja nesta nossa política corruptamente pública ou não.
    Em muitos tempos e espaços, seja no tempo do ensino (superior ou não), seja no próprio trabalho... As panelinhas sempre existiram.
    Mas o que achei interessante é que as panelinhas sempre são o lado poderoso e inacessível. São rodas fechadas e intransponíveis.
    Na sua história “A Panelinha” toma nova forma no contexto. As panelinhas são o grupo do bem, o grupo acessível... O grupo que mostra que nem tudo está perdido!
    Quem dera pudéssemos formar cada vez mais “Panelinhas” como estas que resultem em alimentos saudáveis para o convívio desta nossa nação.

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  2. Marcinha,
    Só uma coisa que acho que vc não entendeu.
    O nome Panelinha da chapa era também uma crítica ao grupo...

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